Agora Katxuyana se escreve com tx: nova ortografia da língua é discutida em Encontro

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No decorrer da primeira quinzena de agosto de 2014, estiveram reunidos em Oriximiná, Pará, cerca de trinta falantes nativos kaxutxuana, para participarem de uma oficina, promovida pelo Programa Tumucumaque do Iepé, com apoio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE do Ministério da Educação.  Realizada na sede da Secretaria Municipal de Cultura de Oriximiná, a oficina foi aberta por seu secretário, com um discurso de acolhida aos Katxuyana nos projetos culturais do município. Também se fizeram presentes representantes da Secretaria Municipal de Educação de Oriximiná. A oficina foi conduzida pelo linguista Spike Gildea, professor na Universidade de Oregon/EUA, especialista em línguas da família Caribe, dentre as quais a língua katxuyana e coordenada por Denise Fajardo (antropóloga, coordenadora do programa Tucumumaque) e Jeciane Souza (assessora do Iepé). O encontro contou, ainda, com a presença dos antropólogos Luisa Girardi (USP), Adriana Russi (UFF), Adolfo de Oliveira (UESC). A imprensa local divulgou em jornal e televisão matérias e entrevistas sobre o Encontro.

Os Katxyana e sua língua

Os Katxuyana são originários do rio Cachorro (rio Katxuru), e por isso mesmo se autodenominam Katxuyana (lit. gente do Katxuru). Hoje vivem ‘espalhados’ em três regiões da calha norte do Pará: além do rio Cachorro, rio Paru de Oeste e rio Nhamundá. Neste Encontro os Katxuyana presentes (lideranças e professores indígenas representando essas três áreas), tomaram para si o propósito de revisitar as ortografias pré-existentes e discutir, com apoio do lingüista Spike Gildea, a construção de uma nova grafia da língua que seja adotada na escrita em geral, principalmente nas salas de aula das escolas locais, e em materiais didáticos a serem revisados e/ou produzidos de agora em diante. A decisão por consensuar e assumir uma grafia única da língua não era algo pré-definido para este Encontro. Existia tanto a possibilidade de decidirem manter suas grafias diferenciadas, refletindo na escrita, distinções observadas nos diferentes sotaques da fala katxuyana, quanto de unificá-los numa escrita comum. Mas as discussões rapidamente se direcionaram para o desafio da unificação, e o que se observou ao longo da semana foi uma sucessão de decisões sendo tomadas, após exaustivamente debatidas, e freqüentemente votadas. A começar pelo próprio nome Katxuyana que antes se escrevia apenas com x, e agora foi definido que se escreve com tx.

E assim construiu-se coletivamente nesta semana um novo sistema de ortografia da língua katxuyana pronto para ser usado nos próximos meses. Seu registro encontra-se no documento “Resultados Técnicos da Oficina do Iepé sobre a Ortografia Katxuyana” entregue por Spike Gildea, o qual será retomado em um próximo Encontro previsto para acontecer em novembro de 2014 na aldeia Santo Antonio (Terra Indígena Parque do Tumucumaque/PA). Até lá, segundo Gildea “seguramente alguns problemas vão surgir, e então poderemos começar a pensar em como resolvê-los. Uma segunda coisa que provavelmente acontecerá quase automaticamente é que o sistema de escrita vai mudar de uma idéia mais abstrata para uma prática mais automática — os próprios escritores katxuyana vão sistematizar as letras das palavras mais frequentes, e vão começar a listar quais palavras podem ser separadas, e quais não, dentre as palavras mais compridas na fala. Uma coisa bem conhecida em estudos de alfabetização é que palavras escritas com menos letras são mais fáceis de ler.” De fato, algumas palavras faladas em Katxuyana chegam a ser compostas por 23 letras ou até mais.

Durante a semana deste Encontro, a cidade de Oriximiná, que situa-se em um ponto equidistante das três áreas onde vivem os Kaxuyana hoje (a leste, centro e oeste da calha norte do Pará), foi palco de decisões importantes em torno da definição de uma escrita comum da língua katxuyana, e de muitos re-Encontros emocionantes com parentes que não se viam há décadas ou que ainda não se conheciam, e  com o linguista Spike que não viam há quase 20 anos. Para Juventino Katxuyana (presidente da AIKATUK- Associação Indígena Katxuyana, Tunayana e Kahyana) que conduziu as discussões ao lado de Spike, “este Encontro possibilitou um re-encontro nosso, enquanto povo Katxuyana. Para não desaparecer, já tivemos que nos separar, deixar nossa terra de origem, quase perder nossa língua, quase perder nossa terra, mas não desistimos de lutar, voltamos, estamos aí, e vamos continuar.”

Essa oficina foi realizada no âmbito do Projeto  “Língua, Cultura e Oralidade na Formação de Professores-Pesquisadores Tiriyó e Kaxuyana” submetido pelo Iepé ao edital de Projetos Inovadores da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão – SECADI do Ministério da Educação – MEC.

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